Perda de um cliente online
Faço parte da turma que encara o trabalho na web muito além do ganha-pão. Sou otimista, visionária, algumas vezes incendiária, e sempre batalhei duramente para que a web seja verdadeiramente um ambiente de profissionais.
Tenho ouvido falar, no correr desses anos sobre os “crimes virtuais”. Nunca fui vítima de um. Especialmente os que se atormentam os bancos. E o setor bancário investe forte em segurança porque ainda com todos os riscos possíveis a internet é capaz de ser muito poderosa. E porque desistir dela é como dar um gigantesco passo para o Terciário, bem lá para trás mesmo. É, no final das contas, dar o braço para o Tiranossauro Rex. E isto não é mais possível.
No entanto, quero abrir parênteses aqui – até porque meu tema é comportamento humano – para ilustrar como uma má experiência web pode transformar potenciais usuários (e, portanto, consumidores) em adversários ferrenhos, portadores de bandeira negra com a internet.
Tenho uma amiga que foi roubada pela web. Vou resumir bem o caso para me ater às consequências disso. Sem nunca ter feito uma transação online ela resolveu vender um objeto relativamente caro, especialmente para ela (5.600 reais). Para isso escolheu o Mercado Livre. Cadastrou-se e recebeu contatos. Recebeu e-mails confirmando cadastros, garantindo idoneidade limpa do comprador, confirmação de depósito no Mercado Pago (forma de pagamento do portal) e fez a parte dela. Enviou o produto. E não tardou a descobrir que tinha caído em uma armadilha.
Na realidade, ela a desconfiar porque, apenas com minha ajuda, alguns dias depois, conseguiu a informação sobre a fraude com o Mercado Livre. Antes, muitos e-mails enviados depois… nada. Situação kafkiana, diga-se. Primeiro o cara para quem ela “vendeu” sumiu (não atendia telefones), segundo, o Mercado Livre começou a enviar e-mails cobrando a comissão da “venda”.
O resultado – depois de minha ajuda e de amigos, diga-se – foi que o ML informou que ela havia “caído “ em uma armadilha fraudulenta (embora não tenha explicado exatamente porque o próprio sistema dele, não fraudulento, enviava e-mails cobrando a comissão).
A pergunta atônita dela para mim era: “escuta, agora nem consigo me descadastrar desse portal!!! Eles me cobram e cobram! Já vi que caí numa armadilha do qual eles se isentam. Mas ainda ter que aguentar um e-mail diferente (a cada vez um nome diferente assinava) ameaçando me protestar por algo que eu presumivelmente deveria pagar a eles…”
Bem, o prejuízo é mais do que material. Há um efeito emocional que é completamente danoso para a internet. Estamos criando uma geração de usuários digitais e as responsabilidades sobre o que é crível ou não, o que funciona ou não e, no final, se as pessoas podem mesmo fazer transações sem ver seu patrimônio estupidamente dilapidado portal afora, é um pouco dever em missão de todos que trabalhamos com internet.
Não estou julgando aqui o mérito, culpas ou não do Mercado Livre – minha amiga está providenciado isto na justiça – , ele tem lá suas regras. Mas perder uma cliente dessa forma é como jogar ouro pela janela afora. Sem contar os depoimentos que ela fará para seus grupos de referência e por aí vai.
No final de contas os portais transacionais deveriam saber que o que está em jogo não é apenas o negócio deles mas o agente do negócios deles que é o consumidor. Deixar que ele seja surpreendido por um fato desse é estatísticamente possível mas o que não pode é se eximir disso, protegendo-se atrás de um “acordo regulamentar”. Isto é necessário, evidente. Mas é necessário que os crimes virtuais não sejam apenas caso de polícia. É preciso que o e-commerce se preocupe um pouco além do proteger suas fronteiras tecnológicas e seu próprio patrimônio. Que se preocupe em preservar e apoiar clientes que sofrem este tipo de situação.
No caso citado, a mim, como amiga e incentivadora da web, restou-me usar de alguns conhecidos para destrinchar o nó kafkiano até que ela tivesse o cadastro suspenso. Não perdi a amiga. Mas perdemos uma consumidora online. Frustrantes questões para pensar…
Risoletta Miranda é sócia e diretora da agência de propaganda digital Addcomm, formada em jornalismo, MBA Marketing COPPEAD/UFRJ, especializada em Planejamento Estratégico de Marketing e Comunicação On Line e uma das criadoras do Conceito de VRM – Virtual Relationship Management – Addcomm.
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